Sr. Manoel Maceda [Manoel Alves dos Santos]

Não conheço muitos contadores de histórias, infelizmente. Mas sei que, além de meu pai e de dona Gê, cuja foto também aparece nessa página, este é um dos grandes – o Sr. Manoel Maceda, que também é cantador no Nove. A voz dele, e o modo da fala, são parte muito importante da atmosfera que ele cria quando conta uma história ou mesmo quando simplesmente conversa. No trecho abaixo há excertos de conversas nossas, para talvez um vislumbre do encadear das palavras, da perspicácia e da poesia de sua fala.

“O dia que eu enxerguei a luz de Deus, eu perdi o futuro maior da vida, que é a mãe”. O pai de Manoel, bebê sobrevivente do parto, tinha feito promessa para que pudesse ter o filho vivo nas mãos, e deu-o a Bom Jesus, para batizá-lo. O pequeno menino morou com a irmã da mãe, em seguida com um tio, então com a madrinha, e aos dois anos a avó, Antoninha, pediu-o – “Vó Donana”, “Mãe”.

Ele foi crescendo enquanto aprendia quase tudo que se pode saber sobre pássaros, onças, árvores, e gente. “Nós temos um pássaro aqui, que ele é muito invisível dos outros. Ele chama Encontro. Ele é pretinho, bem na asa dele, aqui, tem um encontrozinho amarelo, de um lado e outro. Ele arremeda todos os pássaros. Ele arremeda Pinhé, ele arremeda Anu, ele arremeda Gavião; é o jeito dele. Chama Encontro. Ai, se a floresta [polícia florestal] pegar um Encontro daquele na gaiola. Sumiu… pessoal naquele tempo pegava, era muito procurado. Ainda vê lá para cima, nas cabeceira, aonde não está cultivado, não tem muito movimento de gente, você ainda vê ele”.

Ouviu inúmeras histórias que os antigos contavam, e contaria muitas deles mais tarde. Sairia 17 vezes do estado de Minas – para colher café, banana, algodão ou cana-de-açúcar. Vigiar a casa de um primo, ser servente de pedreiro, ou trabalhar em “roçada de mata para pastaria de gado”, como contou. Teria uma fala pontuada por diminutivos, e cantaria com voz suave várias das cantigas velhas que conhecera ainda rapaz, em meio a seus parentes e vizinhos: “Ô, gavião penacho, leva eu pra passear/ Ô, gavião malvado, ele assentou do outro lado”…